EliEla (e eu e nós)

Eu engravidei, ele não sabia o que aí vinha. Tinha acabado de fazer dois anos naquele mês, e até então era o centro do nosso mundo.

Disse-lhe que estava a crescer um bebé na minha barriga, que ele ia ter um irmão ou uma mana e que iam brincar juntos e ser muito amigos. Ele dizia que sim, ficava com aquele sorrisinho malandro como quem acha que lhe disseram uma coisa boa, mas não sabe o que é. 

Os enjoos atacaram, a barriga começou a crescer e alguma coisa tinha mudado. Aquilo do bebé era mesmo a sério? Mas afinal o que era isso mesmo?

No final do ano tivemos a certeza de que esperávamos uma mana e começámos a pensar em nomes.
Um dos mais falados era Inês, e como na escola havia uma Maria Inês, cada vez que se falava na mana, o Afonso chamava-a "Mia Inês". O pai resmungava que para Maria já bastavam a Mãe e as Tias, mas era tudo fogo de vista.

O Rei preparou-se ao longo de nove meses para aquilo que desconhecia, e nós pais, fizemos de tudo para que não houvesse ciumeira.
Ela nasceu, ele foi visitá-la. Ela trouxe-lhe um presente, ele levou-lhe um ursinho. Ele adorou aquela coisinha pequenina vestida de cor-de-rosa que era a sua mana.

Fomos todos para casa. Ele participava no dia-a-dia da sua "Mandinha", nome que lhe começou a chamar após ter tentado fazer o diminutivo de mana.
A Mandinha tinha boas cordas vocais mas dormia a maior parte do tempo, e nos interstícios, o mimo era todo dele. 

Ela mamava, ele levava festinhas com a outra mão, enquanto tomávamos o pequeno-almoço na sala, a ver o Bing, a Mandinha ficava ao nosso lado. Enquanto eu tratava dela, ele esperava. Quando eu estava a tratar dele e ela chorava, dizia em voz alta: "Agora é a tua vez de esperares Inês, que eu estou a tratar do teu irmão."

Quando vinham visitas, o Afonso era O importante. Ele agora tinha uma mana e isso dava-lhe um estatuto diferente. As pessoas perguntavam-lhe se podiam vê-la e às vezes levavam com a sua possessividade: "Não, tu não podes vê-la porque a Mandinha é minha".

Ela começou a ver...e no meio das sombras vislumbrava uma criaturinha aos saltos que gostava de lhe puxar os pés e os braços, e de dizer coisas imperceptíveis na sua cara, enquanto entoava canções.

Ela resmungava: "Alguém que me tire esta criança imatura daqui, antes que ele me desmembre...Vocês não estão a ver, mas ele ainda vai atirar aquele comando à minha cabeça e eu não sei desviar-me". 
Às vezes percebia-se o olhar de pânico e nisto começava aos gritos.

Ele esforçava-se para lhe chamar a atenção, entretê-la e mostar-lhe as suas habilidades de mano mais velho. Tinha um objectivo muito claro -fazer com que ela o admirasse e torná-la sua discípula-.
Mas quando ela abria o berreiro, ele dizia para si mesmo: "fogo, mas que histérica, eu não a abanei assim tanto, vê-se mesmo que é gaja!" E depois abandonava a sala incomodado, pois não estava habituado a ouvir alguém gritar mais alto do que ele próprio.

Mas o amor é mesmo assim, encontra caminhos por entre as diferenças e hoje, 5 meses depois, eliela são um do outro. Adoram-se e admiram-se mutuamente. Ela procura-o quando não o vê, sorri com o rosto todo, impressionada quando ele faz aquelas macacadas de bebé crescido e dá valentes gargalhadas quando corremos juntas atrás dele. Ele consegue acalmá-la e faz-lhe muita companhia.

Ele avisa-me quando ela está a chorar, quando ela está a ameaçar atirar-se da espreguiçadeira abaixo, quando ela está aborrecida e começa a barafustar. Ele preocupa-se se ela tem medo de estar sozinha no quarto. 

Ele dá-me recados por ela: "Mãe, a Mandinha mandou dijer que já acordou", ele defende-a quando acha que eu estou a pisar a linha com ela: "Mãe, não janga com a Mandinha". Ele empresta tudo o que é/foi dele e que agora ela usa.

Eliela adoram-se e eu a eles. Que mais poderei pedir?


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